sábado, 19 de novembro de 2011


ERRO


Até as estações se confundiram e o frio invadiu o verão que se anunciava.

O poema que alguém declamaria se desfez em palavras de silêncio.

O que elas então não mais diziam invadiu as frestas

e as possíveis conversas.

Refletiu no espelho como tempo passado

e fez o dia anoitecer mais cedo.

quarta-feira, 13 de julho de 2011


ENQUANTO ESPERO

Umas poucas vontades são suficientes para justificarem a caixa de lápis de cor.

E uns outros guardados de tinta e papel.

Num sonho levanto-me para tomar o café da manhã e antes que eu possa olhar suficientemente a paisagem, já anoitece.

Pesadelo dos bens ruins.

Em outro, deixo escorrer entre meus dedos os brilhos capturados de estrelas e por tal façanha sou condenada a ter as pontas dos meus cabelos cortadas e jogadas para dar de comer às formigas e a outros insetos.

Muito ruim também.

Com freqüência giro em torno de mim e de uns poucos objetos até ficar bem tonta e infeliz.

Depois penso em um lugar onde quero chegar e passar muito do meu tempo.

E nesse lugar faço caberem e serem felizes umas outras pessoas.

Melhoro então o pensamento

e aguardo.

quarta-feira, 4 de maio de 2011


NASCER

para as mães

Não é preciso primavera para se vislumbrar alguma coisa que nasce.

Quando o sol se põe nasce a noite.

De longe, ao observarmos o por do sol, percebe-se que se formos desarvoradamente ao seu encontro, permaneceremos nele pra sempre. E poderemos ver o crepúsculo dando voltas na terra.

Mas isso é um pensamento.

Também é um pensamento que a tarde tem asas cor de fogo que se fecham no horizonte.

Igual no meu sentimento.

No cenário escuro de uma imensa noite, pode-se ver nascer um amor, uma saída, uma mudança ou um filho.

E outro,

em um outro amanhecer.

terça-feira, 29 de março de 2011


CANTIGA DO DESMITO

para as minhas amigas


Ao cumprir o esperado

da espera do amado,

teço minhas tramas,

enfeito meu bordado.

Mas não penses que o faço

na conformidade de uma sina.

Do meu canto de espera

não ouvirás triste lamento.

À dor da saudade,

cantarei até obscenidades

e direi ao vento

que mantenho uma porta aberta

pra eventuais visitas.

E se demorares demasiado,

meu amado,

me enfeito com meu tecido

(dever cumprido).

E serve o teu jantar

que eu não vou voltar.

sábado, 19 de março de 2011


ÁRVORE


Pretendi criar raízes e finquei os pés e finquei os pés bem aqui.

Fiz crescer um tronco sólido e uma copa espessa de folhas bem verdes eu produzi.

Minha alma pegou carona no pólen da primeira flor que concebi.


sábado, 26 de fevereiro de 2011




PORVIR

A tarde tem anseio de outono e cai sobre os olhos cansados.
O que se poderia à margem do rio corre com as águas.
O porvir ainda não mostrou seu encanto.
A utilidade é um verme que assombra até o amor.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011


QUASE

Enquanto a tarde quase terminava eu quase escrevi uma coisa que me ocorria e quase fiz um desenho.
Ando quase no ponto de tomar umas decisões e atitudes importantes. Quase tive uma boa idéia.
Quase me lembrei de umas coisas que eu não podia esquecer e quase liguei para uma amiga.
Vi que no quarto o homem e a cachorra cochilavam e estavam quase iguais.
Fiquei na rede na hora em que era quase noite. Quase nada era muito necessário.
Uma ordem que me deixou quase feliz.

domingo, 16 de janeiro de 2011


RECORDAÇÕES

Esse negócio de desvestir um santo pra vestir outro pode ser mais ou menos assim um revezamento. Os santos são setorizados conforme suas aptidões e quando não dá pra deixá-los todos bem vestidinhos, a gente elege o que a circunstância solicita.
Não dá pra se ter tudo de uma vez.
Tem momentos que são para as lembranças e outros para os acontecimentos. Como tem lembrança que acontece mais do que acontecimento, está bem bom assim. Considero ganho o meu tempinho aparentemente perdido.
E cuido de guardar as preciosidades em seus lugares devidos. Pra que eu possa tê-las quando me for conveniente.

sábado, 1 de janeiro de 2011

FRUTA DA ESTAÇÃO

O acúmulo de tarefas faz pesarem as pálpebras.
Instala-se um silêncio.
Por muitas vezes saboreia-se as amoras de um mesmo pé. Um sentimento é registrado num pequeno pedaço de papel que se vai com as amoras.
Depois, vão-se as jabuticabas entre outras importâncias. Nos dias de agora, são as lichias que melam os dedos e, em exagero de fartura, também enchem as vistas.
O silêncio cala estes e outros assuntos.
E assim, os pincéis, canetas e lápis esperam. Mas sem descanso.
É empurrado um pouco para frente um tempo que a fé alimenta e aumenta.
Mas as pálpebras já estão mais pesadas entre outros pesos.
Deixa estar. Depois há uma volta.
Com acréscimos.